sem medo | 02 de fevereiro de 2024
À memória de Julieta Hernández.
E a todas as mulheres & meninas do mundo.
Boa leitura!
quem mandou viajar sozinha?
À frente do projeto Mulheres Viajantes, Thaís Carneiro quer estimular mulheres a ocupar espaços e ganhar o mundo
Em 10 de janeiro de 2016, María José Coni e Marina Menegazzo deixaram suas casas em Mendoza, na Argentina, rumo a uma viagem pela América do Sul. Como parte do roteiro, exploraram juntas diferentes cidades do Equador. Mas de lá não voltaram. Em 28 de fevereiro, seus corpos foram encontrados numa área costeira de Montañita com sinais de violência física e sexual. Elas tinham 22 e 21 anos, respectivamente.
Para a paulistana Thaís Carneiro, o caso foi um estopim. Não bastasse a brutalidade do feminicídio, revoltou-lhe o tom adotado pela imprensa na cobertura do crime: “Me deixou muito mal, porque era uma ideia de: ‘Como elas tiveram essas posturas dissonantes?’”. Decidiu então criar um blog para compartilhar relatos de viagens seus e de outras mulheres. Com o título “Mulheres Viajantes”, quis construir uma rede de apoio feminino e um espaço de reflexão sobre o que é o tal “lugar de mulher”.
De lá para cá o projeto ampliou seus contornos, tornando-se “uma agência de experiências histórico-culturais com foco na história das mulheres”. São 30 roteiros conduzidos por Thaís em São Paulo, entre eles uma caminhada pelo centro histórico sob o olhar das mulheres modernistas, como Pagu e Tarsila do Amaral, e uma visita ao Museu de Arte de São Paulo (MASP) para discutir a representatividade feminina em obras do acervo. Segundo ela, desde 2019 mais de 3 mil pessoas participaram dos tours.
Com ingressos entre R$ 70 e R$ 80, os roteiros não são exclusivos para mulheres, mas o público, como era de se esperar, é majoritariamente feminino. A faixa etária gira em torno dos 30 anos, mas a divulgação no Facebook trouxe uma turma inesperada: “Mulheres aposentadas, geralmente professoras”, comemora. Há na demografia uma surpresa ainda maior: “80% são pessoas de São Paulo. Não é nem que são brasileiras. São de São Paulo, mesmo. Isso é muito doido”.
“Às vezes as pessoas moram na própria região do centro”, continua, “só que não param pra ver a cidade ou têm medo de parar nesses lugares”. E se tem algo que Thaís faz, é ver, explorar, desvendar a cidade. Por exemplo: você sabia que existem na capital paulista mais de 50 piscinas públicas e gratuitas? Pois é. Achados de quem é curiosa sobre o mundo ao redor (e compartilhados nas redes sociais do Mulheres Viajantes).
Foi em 2010, aos 19 anos, que Thaís viajou sozinha pela primeira vez. Partiu para um mês de intercâmbio em Buenos Aires, na Argentina. Chegar até lá não foi simples. Nascida no Imirim, na periferia de São Paulo, conta que vem de uma “família emergente”: seus pais ascenderam socialmente pela via dos estudos. Na casa dos Carneiro, viajar não era costume: “A gente fazia as mesmas viagens pra visitar a família. E a cada seis meses a gente ia pra um lugar mágico chamado hotel-fazenda. Passar duas noites, porque era muito caro”.
Incentivada a viajar pelo curso de inglês, percebeu a partir do exemplo de uma conhecida que não era assim tão impossível pagar o intercâmbio para a vizinha Argentina. “Juntei todo o dinheiro que pude”, lembra. Priorizou andar a pé, adotou a marmita no trabalho, abriu mão do tênis da moda. Hábitos que, em nome de planejar viagens, ela e o marido escolhem manter. O casal não tem filhos.
Thaís diz que a experiência em Buenos Aires foi transformadora, tanto que ainda hoje considera a cidade seu “lugar de conforto”. Fala que, sozinha em outro país, teve de aprender a se virar, entendeu o valor do seu dinheiro, descobriu novas formas de viver o espaço urbano. E se libertou de um relacionamento abusivo: “A relação durou até 2013. Era péssimo. E a gente não viajava. A primeira coisa que eu fiz quando terminamos foi viajar”. O destino? Argentina.
Levou menos de um ano até conhecer o atual marido – mas Thaís faz questão de frisar que, mesmo casada, às vezes viaja sem ele. Estima que até aqui foram entre dez e vinte viagens sozinha. Declara-se “obcecada por conhecer coisas novas”: “Viagem, pra mim, é um prazer, mas também é uma forma de aprender. Porque eu tenho a sensação de que quando a gente fica muito num lugar, a gente constrói noções sacralizadas de certo e errado. Esse contato com outras pessoas eu acho muito especial”.
Nesse espírito de celebrar encontros, quando criou o blog, em 2016, logo pensou um modo de trazê-lo ao offline, organizando rodas de conversa com mulheres interessadas em viajar. “Fiz em São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba, Salvador, Ouro Preto...” Destaca o caso de uma jovem em Belo Horizonte: “Ela nunca tinha viajado sozinha. Depois da roda de conversa, tomou coragem e foi pra Bahia”.
Um desses eventos, na livraria paulistana Tapera Taperá, rendeu fartos frutos. Formada em História pela Universidade de São Paulo (USP), em 2017 Thaís promoveu uma mesa-redonda sobre mulheres viajantes do século XIX com os especialistas Amilcar Torrão Filho e Stella Maris Scatena Franco. Pois daí engatou mestrado e doutorado no tema, ambos na USP. “E a Stella é minha orientadora até hoje”, arremata.
No mestrado, estudou a viajante colombiana Soledad Acosta de Samper, em 1892 (a tese está disponível aqui). Já o doutorado, em fase inicial, tem como foco a espanhola Baronesa de Wilson e as peruanas Aurora Cáceres e Clorinda Matto de Turner, no começo do século XX. Moral da história: “Não é de hoje que as mulheres viajam sozinhas”.
Além da academia, Thaís tem uma trajetória na educação, tanto em escolas quanto em museus. Inspirada pelo que viu no encontro anual de uma rede de blogueiros de viagem, decidiu se formar guia de turismo e monetizar seu projeto. “Eu morava no centro. E se eu fizer um tour sobre a história das mulheres na região?” Nascia assim, em 2019, o formato atual. Em 2022, foi uma das ganhadoras do prêmio Empreendedora de Destaque, da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo.
Passados oito anos desde o início do Mulheres Viajantes e seu principal gatilho, o assassinato das jovens argentinas, outro feminicídio contra uma mulher viajante paira sobre nós. No último 23 de dezembro, a artista circense venezuelana Julieta Hernández foi morta em Presidente Figueiredo, no Amazonas, vítima de roubo, violência sexual e agressões. Desde 2019 Julieta viajava o Brasil de bicicleta, partindo do Rio de Janeiro em direção à Venezuela para encontrar a família.
“Podia ser eu. Podia ser uma amiga minha. Quando a Julieta morreu, fui direto procurar notícias de uma amiga que tá fazendo uma cicloviagem. Fiquei desesperada”, conta Thaís. “E é uma banalização total”, continua. “Porque a Julieta, ela foi morta por um celular. Ela foi queimada viva por um celular. Uma porra de um celular. E no lugar que ela estava pagando pra se hospedar. É um rolê surreal.”
Pergunto se vê diferença no modo como a imprensa tratou a morte de Julieta em relação a María José e Marina. “Acho que mudou a postura. Entendo a imprensa tradicional ter essa ideia de: ‘Olha, elas foram muito rebeldes, foram pra uma cidade conhecida pelo tráfico de drogas’. Então não deveríamos pisar em São Paulo... Mas na época me surpreendeu ver mulheres com esse discurso. Agora houve pelo menos um disfarce em relação a isso.”
Thaís abre um novo caminho de reflexão: “Até há uma banalização no sentido de: ‘Ai, é muito fácil viajar sozinha. Você não vai porque é preguiçosa’. Ou melhor: ‘Você não vai porque é refém do patriarcado’. E não é assim. A gente tá falando com mulheres que às vezes não vão almoçar sozinhas. É uma construção de narrativa. Você tem que entender o que está te movendo a ir”.
Porque hora ou outra sua experiência será atravessada pelo fato de que não há um homem ao seu lado. “Historicamente, a rua era dos homens. As mulheres deviam estar no cuidado doméstico. Elas são passionais, irrefreáveis. Precisam de tutela”, explica. “A partir do momento em que a gente vai pra rua, vêm esses resquícios de um lugar que era de domínio masculino, porque a gente tá ocupando o espaço deles. Portanto, nós somos públicas. Nossos corpos são públicos.”
Conforme nosso almoço em um restaurante na região da avenida Paulista chega ao fim – logo mais Thaís conduzirá um tour no Instituto Moreira Salles para crianças com deficiência ou dificuldade de aprendizagem, parte do projeto Aprender na Prática –, trocamos nossas vivências enquanto mulheres que viajam sozinhas. As dores e as delícias. As vulnerabilidades e as condescendências.
Mas me surpreende quando ela conta dos episódios em plena condução dos roteiros: “Se é um grupo de mulheres, carro para pra buzinar, homem entra no meio do grupo pra falar: ‘Vocês são lindas’. Outro dia veio um cara aleatório e disse: ‘Mas por que você não fala da fulana de tal?’. Agora, quando eu tenho um homem no grupo, não tem ne-nhu-ma abordagem”, diz, soletrando na fala a disparidade.
Para fechar, peço que Thaís dê dicas a mulheres que desejam ganhar o mundo: “Comece devagar. Pense qual roteiro te interessa mais. E eu optaria por um hostel, porque ali você conhece outras pessoas. Dá pra pegar um quarto e banheiro individuais, se quiser”. Recomenda ainda compartilhar detalhes do itinerário (dados de voos, nome de hotéis, contato de anfitriões) com pessoas atentas e de confiança: “Não vai evitar que algo aconteça, mas é alguém que poderá ir atrás do seu socorro”.
Como resume uma participante nas rodas de conversa do Mulheres Viajantes: “Vá. Medo é uma coisa que a gente vai sentir sempre. Então, vai com medo, mesmo”.





não vá se perder por aí
Mas você vai sozinha?, de Gaía Passarelli (Globo Livros, 2016)
Sisterwave, comunidade de serviços de viagem por e para mulheres
si me matan
Silvana Estrada
Que ya nadie nos calla. Nada nos contiene
pensam que jornalistas escrevem com as mãos
Em dezembro de 2022, o Instituto Vladimir Herzog lançou o projeto Acervo Imprensa de Resistência, parte de um portal mais amplo chamado Memórias da Ditadura.
Como o nome já diz, trata-se de um acervo digital de veículos da imprensa alternativa que circularam durante a ditadura militar brasileira – de 1964 a 1985, portanto, com especial força nos anos 1970.
São mais de 60 periódicos publicados em todas as regiões do país, editados pelos mais variados grupos e movimentos. Em comum, a oposição ao regime militar.
Oportunidade de ouro para navegar em outras linguagens, outros caminhos gráficos, outros tons e abordagens. Ver o que mudou (o vocabulário, que muitas vezes não cabe mais) e o que permanece (a luta pelos direitos de sempre). Quem saiu de cena e quem, décadas depois, segue dando as cartas.
E o tanto que, de lá para cá, a imprensa brasileira encaretou? Ave Maria.
É possível baixar os exemplares em formato PDF. Em outra seção do portal, há um panorama geral sobre o que foi a imprensa alternativa, sua trajetória e os títulos que marcaram época.
Aviso aos navegantes: muitas das publicações emblemáticas não estão aqui. O Pasquim, por exemplo, mora na Biblioteca Nacional. O Lampião da Esquina, no site do Grupo Dignidade.
Abaixo, uma seleção minha de veículos do acervo com recorte de gênero. Periódicos femininos, cada um com linhas editoriais & ideológicas próprias. Porque, pasmem, há entre as mulheres diversidade de pensamento.
Sugiro especial atenção a Mulherio, cujo expediente é um desbunde: Lélia Gonzalez, Carmen da Silva, Maria Rita Kehl e até Ruth Cardoso, bem antes de ser primeira-dama.
Só um minuto. Antes da galeria de imagens, um causo rápido (com versões conflitantes na Internet). Consta que, no início dos anos 1960, alguém contrariado com as colunas do jornalista Antônio Maria no Última Hora mandou que pisoteassem os dedos de suas mãos para que ele não pudesse mais escrever. No dia seguinte, Maria deu a letra no jornal:
“Que bobos! Eles pensam que jornalistas escrevem com as mãos”.






não é de hoje que elas gritam
fundamento | intelectualidade negra brasileira
Falando em Lélia Gonzalez, foi lançado em 2023 um livro que merece vossa atenção: Griots e tecnologias digitais, com organização de Thiane Neves Barros e Tarcízio Silva.
A proposta é analisar temas contemporâneos em tecnologia e sociedade a partir do pensamento de 11 ícones da intelectualidade brasileira. O resultado são artigos escritos por pessoas pesquisadoras de diferentes campos do conhecimento e regiões do país, todas elas pessoas negras.
Não só a obra encontra uma maneira inovadora de discutir tecnologia, como oferece uma porta de entrada para o trabalho de nomes fundamentais como Abdias Nascimento, Milton Santos, Sueli Carneiro, Antônio Bispo dos Santos (sobre quem falei em Avoada #2) e a própria Lélia. Um exercício bonito de reverência intelectual & política, sem medo de fincar firme suas bandeiras.
Pois li o livro e trago abaixo um brevíssimo resumo de cada artigo, com a intenção de ajudar a guiar sua leitura. Agradecimentos a Taís Oliveira, do Instituto Sumaúma, que autorizou a reprodução de trechos.
E a informação mais importante: o livro está disponível para download gratuito aqui. Se preferir comprar a cópia física, vá por aqui.
Capítulo 1. “Do pretuguês tecnológico à blogagem coletiva: a reconstrução de um caminhar tecnológico diante da virtualização da vida”, por Viviane Rodrigues Gomes, Charô Nunes e Larissa Santiago
Coordenadoras do coletivo Blogueiras Negras, as autoras articulam diferentes categorias construídas por Lélia Gonzalez – em especial a ideia de “pretuguês” – para refletir sobre iniciativas de pessoas negras que buscam fazer da tecnologia um instrumento de enfrentamento ao racismo e ao sexismo.
[...] há tempos, as mulheres negras sabem, através da linguagem, que a tecnologia possui um papel preponderante nas sociedades atuais, e que se quisermos uma sociedade livre do racismo, do sexismo e das opressões, é preciso incidirmos também na tecnologia. (p. 18-9)
Capítulo 2. “O exercício do sujeito posicionado de Beatriz Nascimento por feministas negras nas redes sociais”, por Dulcilei da Conceição Lima
Crítica da “produção hegemônica do conhecimento acadêmico”, Beatriz Nascimento defendia a importância de pessoas negras se apropriarem dos estudos raciais e pensarem a história a partir de perspectivas próprias. O artigo investiga de que modo mulheres negras feministas atuantes nas redes sociais dialogam com essa proposição.
A obra de Beatriz Nascimento padece desse “esquecimento” voluntário no ambiente acadêmico, só recentemente, por força da mobilização de mulheres negras, em sua maioria feministas, que chegaram ao ensino superior, é que sua produção vem sendo mais lida, divulgada e celebrada. (p. 36)
Capítulo 3. “Ciberquilombismo – o quilombismo de Abdias Nascimento e sua atualização na cibercultura”, por Nelza Jaqueline Siqueira Franco
Tomando como ponto de partida a obra O quilombismo (1980), de Abdias Nascimento, a autora reflete sobre a ideia de “ciberquilombismo” e a forma como os espaços de organização negra no ambiente digital criam uma “rede de afirmação, (re)existência, resistência, denúncia, articulações para pautar as demandas do povo negro”.
Com base no modelo associativo e comunitário dos quilombos e tendo a perspectiva afro-brasileira como centro, Abdias Nascimento propõe o Quilombismo como forma de resistência e reinvenção da experiência negra em solo brasileiro. (p. 51)
Capítulo 4. “Ciência, tecnologia e interdisciplinaridade: as críticas visionárias de Abdias Nascimento”, por Taís Oliveira
Também a partir de O quilombismo, a autora se dedica a uma análise crítica a respeito da ciência e tecnologia contemporâneas, com especial interesse pelas possibilidades trazidas pela interdisciplinaridade – um marco na trajetória de Abdias Nascimento, um intelectual muito à frente do seu tempo.
É como se, mais uma vez visionário, Abdias Nascimento nos dissesse: preparam-se de modo interdisciplinar, pois o que pode vir por aí é complexo demais para caber em caixinhas predefinidas de conhecimento. (p. 78)
Capítulo 5. “Entre aparelhos de repressão e a quilombagem: vigilância e contra-vigilância negra a partir do olhar de Clóvis Moura”, por Elizandra Salomão e Pedro Diogo Carvalho Monteiro
Propondo um diálogo entre a dark sousveillance de Simone Browne e a quilombagem de Clóvis Moura, o artigo investiga novas e antigas tecnologias de vigilância e controle de corpos negros, junto com as estratégias de defesa historicamente desenvolvidas pela população negra.
Nessas articulações entre as contemporâneas Benjamim e Browne com a compreensão de Clóvis Moura sobre a questão racial como estruturante das relações na sociedade brasileira, podemos entender que o racismo e a raça são verdadeiros algoritmos que programam todo o universo tecnológico da sociedade e, nesse sentido, os aparatos de controle e repressão. (p. 87)
Capítulo 6. “Cida Bento e Iray Carone: entre os pactos e os silêncios das performances da branquitude nas redes sociais”, por Catharinna Marques
Para pensar noções de branquitude e o ativismo antirracista de pessoas brancas no ambiente digital, a autora se inspira nas pesquisas de Maria Aparecida Silva Bento e Iray Carone. “Como os sujeitos brancos mostram-se aliados às lutas dos movimentos negros no ciberespaço?”, desvenda o artigo.
Ao provocar o campo da Psicologia brasileira, Cida Bento e Iray Carone explicitam os impactos das desigualdades sociorraciais e os desdobramentos na constituição da psique não apenas dos sujeitos negros, mas sobretudo, influenciando a concepção que os brancos têm de si e daqueles que são os seus diferentes. (p. 103)
Capítulo 7. “Zélia Amador de Deus e o legado científico-tecnológico de Ananse para a luta de mulheres negras na Amazônia paraense”, por Thiane Neves Barros
A autora pensa as experiências de mulheres negras amazônidas na comunicação digital a partir de Zélia Amador de Deus e sua tese de doutorado (2008), cujo debate sobre a presença negra nas universidades usa o mito de Ananse como metáfora. A interpretação sobre o movimento das ondas do mar na página 120 é linda!
A Amazônia é um território multidimensional e de múltiplas territorialidades porque se apresenta de diversas formas. Observe que romper com o estigma de uma Amazônia fantasiosa é o fio/ação mais forte nos ciberativismos das herdeiras de Ananse. (p. 123)
Capítulo 8. “Aprendendo com Sueli Carneiro: estratégias de hackeamento do dispositivo de racialidade”, por Pâmela Guimarães-Silva
Citando intelectuais como Michel Foucault e Charles Mills, o artigo analisa os movimentos de subjetivação e emancipação produzidos pelas colunas de Sueli Carneiro no jornal Correio Braziliense, no início dos anos 2000, em especial à luz dos conceitos de “dispositivo de racialidade” e “epistemicídio” trabalhados por Carneiro.
[...] Sueli Carneiro é a responsável pelo primeiro site de organização não governamental do Brasil, o Portal Geledés, e também é uma das fundadoras do Geledés - Instituto da Mulher Negra, cuja uma das primeiras ações foi a promoção de capacitação de mulheres negras nas chamadas TICS — Tecnologias da informação e comunicação. (p. 135)
Capítulo 9. “A experiência transformadora da Academia Preta Decolonial: tessituras de um diálogo com Nilma Lino Gomes e os ‘saberes emancipatórios’”, por Michelly Santos de Carvalho e Leila Lima de Sousa
Em 2020, durante a pandemia de COVID-19, teve início o curso de educação antirracista Academia Preta Decolonial, ministrado de forma remota. O artigo parte dos “saberes emancipatórios” de Nilma Lino Gomes para refletir sobre a experiência e as potencialidades da educação enquanto elemento de emancipação social.
“São os corpos pretos que precisam se adaptar à Universidade ou é a Universidade que precisa acolher novas/outras epistêmes?” (SILVA, F., 2020, informação oral) (p. 152)
Capítulo 10. “Tecnologias emergentes: reflexões a partir da intelectualidade de Milton Santos”, por Taís Oliveira e Tarcízio Silva
Em diálogo com reflexões de Milton Santos a respeito da relação entre natureza, homem e tecnologia, o artigo problematiza tecnologias emergentes como reconhecimento facial, plataformização do trabalho, inteligência artificial e seus impactos socioambientais.
A técnica, para Milton Santos, é banalidade e enigma, e é como um enigma que ela ordena nossa vida, impõe relações e administra nossas interações com o entorno. (p. 172)
Capítulo 11. “Antônio Bispo e o legado da contra-colonização: possibilidades para a governança da Internet”, por Mariana Gomes da Silva Soares
Fundamentando-se em textos e falas públicas de Nêgo Bispo, a autora usa as ideias de “contra-colonização”, “confluência” e “transfluência” para analisar de forma crítica o hiato digital e a atual demografia nas entidades representativas da governança da Internet.
Arriscamos dizer que na governança da internet, nem mesmo o lugar de “outro” é oportunizado aos povos contra-coloniais. (p. 186)
A publicação conta ainda com prefácio de Zelinda Barros e posfácio de Paulo Victor Melo. Esbalde-se – e faça bom proveito das referências bibliográficas!
espia
Esta deliciosa matéria publicada em janeiro no Diário do Nordeste sobre a cena ballroom do Ceará. Obra da jornalista Ana Beatriz Caldas, com fotos ótimas & muita referência sobre essa cultura criada na Nova York dos anos 1960 à base de dança, moda, pertencimento e carão. Se você não tem ideia do que eu estou falando, mais um motivo para ler. Vogue!
Este documentário de 2022 sobre a gravação do álbum “Um disco normal”, da banda de grindcore Test. E eu te prometo, enquanto pessoa que se alimenta de Billie Holiday e Elis Regina, que não é obrigatório ser fã de grindcore para apreciar as experimentações de João Kombi & Thiago Barata, desde a escrita das letras e o esquema dos shows até a linguagem do documentário.
Em notas mais poéticas, esta participação do ator argentino Ricardo Darín no programa Sangue Latino, do Canal Brasil, em 2014, é de suspirar. Utopias, amores, vertigens e Cem anos de solidão derramados ao longo de vinte minutos. Quase uma meditação.
“sigríður ragnarsdóttir”, de ragnar axelsson
Há mais de 40 anos o fotógrafo islandês Ragnar Axelsson registra a vida no Ártico, em suas regiões mais remotas.
É das coisas mais bonitas.
Por aqui você chega ao site oficial de Rax.
E aqui, a história de Sigríður Ragnarsdóttir, retratada na foto acima, única moradora de uma fazenda no noroeste da Islândia.
it’s time. bom carnaval!
fim.